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Apresentada como a solução, cloroquina decepciona no combate ao Covid-19

Celebrada há um mês pelo presidente Jair Bolsonaro como solução definitiva para o fim da pandemia do novo coronavírus no país, a cloroquina entrou na rotina de hospitais públicos e privados como parte do tratamento da Covid-19, mas está longe de cumprir a expectativa depositada pelo presidente.
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Foto reprodução
Ainda que seu uso tenha sido regulamentado pelo Ministério da Saúde para casos graves, nos últimos 40 dias os registros de contágio e de mortes confirmadas pela doença aumentaram no país, médicos denunciaram reações adversas ao medicamento, seu uso preventivo foi descartado e até mesmo o ministro da Saúde, Nelson Teich, já considera que ele não pode mais ser tratado como um “divisor de águas” no tratamento dos casos da Covid-19, como fez crer o presidente.
Bolsonaro passou a defender a medicação — usada contra malária, lúpus e artrite reumatoide — depois de voltar de uma viagem aos Estados Unidos, em meados de março deste ano.
Naquele país, o presidente Donald Trump citava o fármaco como resposta ao risco de uma tragédia ocasionada pela pandemia no país. Assim como ocorreu no Brasil, o discurso foi abandonado tão logo os EUA se tornaram nação com o maior número de casos confirmados (1,09 milhão) e de mortes no mundo (63,5 mil).
A agência reguladora de alimentos e drogas dos Estados Unidos (FDA, na sigla em inglês) alertou na última semana para “anormalidades perigosas no ritmo cardíaco de pacientes” tratados com o medicamento e determinou que ele fosse usado apenas em testes clínicos ou hospitais com doentes sob monitoramento.
Um painel de 50 especialistas do Instituto Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês), entre eles consultores do governo americano, já havia divulgado recomendação contra o uso do medicamento, pela insuficiência de resultados clínicos satisfatórios.
No Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Ministério da Saúde vetam oficialmente o uso do medicamento como forma de prevenção. O CMF liberou a prescrição a pacientes, ainda que em parecer tenha lembrado que não existam pesquisas que comprovem a eficácia do medicamento contra a covid-19. A autarquia justificou a medida devido à falta de alternativas para tratamento.

Pesquisas no Brasil

Pelo menos 15 pesquisas sobre seu uso foram aprovados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e estavam em curso, mas, na última semana, uma delas foi suspensa: conduzida pelo grupo Prevent Senior, seus dados preliminares apontaram eficácia do medicamento no uso combinado com o antibiótico azitromicina, como forma de reduzir o período de internação de infectados.
O “sucesso” do estudo foi alardeado pelo presidente Bolsonaro em suas redes. Dias depois, o Conep encontrou indícios de que o trabalho tenha sido conduzido antes do período autorizado pelo órgão regulador. A pesquisa também considerou, em nível estatístico, pacientes que nem sequer foram testados para a doença.
Quando vieram à tona os problemas do estudo, a Prevent passou a negar tê-lo realizado, ou mesmo o divulgado. Bolsonaro não apagou os posts sobre o assunto. Os responsáveis foram chamados a prestar esclarecimentos à Conep.
— Aparentemente, o que fizeram foi apresentar uma não-pesquisa como pesquisa, o que pode configurar uma fraude científica — diz o coordenador do órgão regulador, Jorge Venâncio, que afirma aguardar o envio de documentação complementar por parte do grupo, antes que o órgão decida sobre enviar ou não o caso ao Ministério Público.
Na última quarta-feira, o ministro Teich deu um banho de água fria em bolsonaristas que esperavam uma guinada em defesa do medicamento para tratamento à doença.
— Cloroquina hoje ainda é uma incerteza. Houve estudos iniciais que sugeriram benefícios, mas existem estudos hoje que falam o contrário. Os dados preliminares da China mostram que teve mortalidade alta e que o remédio não vai ser divisor de águas em relação à doença — disse.
Em meio ao debate, médicos de São Paulo — epicentro da doença no país, com dois quintos do total de registros de mortes em território nacional — têm receitado a cloroquina para pacientes graves em alguns dos principais hospitais. Há também exemplo de veto, pela falta de estudos conclusivos.
Os hospitais Albert Einstein, Sírio-Libanês e Hcor participam da pesquisa Coalizão Covid Brasil, que reúne cerca de 60 hospitais do país e conta com o apoio da indústria farmacêutica,  para avaliar os efeitos da cloroquina em pacientes com menor e maior gravidade. Os primeiros resultados estão previstos para junho.
Tanto no Einstein (voltado para a elite paulistana) quanto no hospital de campanha do Pacaembu — que é administrado pela mesma instituição em parceria com a prefeitura — a cloroquina é considerada parte do tratamento e administrada apenas para pacientes graves.
No Sírio-Libanês, a decisão de administrar ou não o medicamento cabe às equipes médicas, de acordo com o hospital. “O uso não é proibido, mas também não é recomendado”, informou o hospital.
O Hospital das Clínicas de São Paulo, maior complexo hospitalar da América Latina, disse seguir o protocolo do Ministério da Saúde, que prevê o uso apenas em casos graves. Ainda assim, “o uso da cloroquina não é uma recomendação institucional”, segundo informou a direção.
A Unicamp, que administra o Hospital das Clínicas em Campinas, divulgou texto em que afirma que, baseados em manifestações de especialistas “corrobora as recomendações dos órgãos sanitários e da comunidade médico-científica mundial de que não há, até o momento, evidência científica suficiente baseada em ensaios clínicos com humanos sobre a eficácia desses medicamentos para o tratamento da doença causada pelo novo coronavírus”. Por isso, a instituição não recomenda a administração da medicação.
Em Santa Catarina, a Justiça tirou do ar na última semana endereços eletrônicos ligados a um médico que vendia, ao custo de R$ 89, receitas de cloroquina para tratar Covid-19, o que é ilegal e totalmente contraindicado pelas autoridades de saúde.
 O GLOBO

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