Tainá Ramos, de 23 anos, é roteirista de cinema e não tem
Instagram. Em junho de 2018, ela excluiu sua conta pela segunda vez. A primeira
foi em 2015. O motivo não foi a falta de internet ou celular. O que a levou a
tomar tal decisão foram problemas de autoestima.
— O Instagram foi bom até certo ponto, porque eu peguei uma
época de empoderamento feminino, de mulheres gordas se aceitando e de mulheres
negras aceitando seu cabelo. Eram muitas inspirações. Mas eu percebi que até
para as mulheres negras tinha um padrão. Se você não tivesse o cabelo mais
cacheado, não fizesse uma maquiagem muito forte ou não usasse uma roupa e um
calçado da moda, você não recebia a mesma quantidade de likes da amiga. E se eu
não tivesse a quantidade de likes que eu considerava suficiente em uma foto,
começava a me achar feia. Isso não me fazia bem e decidi excluir — contou
a jovem.
Se você também já se sentiu mal com o próprio estilo de vida
ao se comparar com amigos no Instagram, saiba que não é sem razão. Uma pesquisa
da Royal Society for Public Health, instituição de saúde pública do Reino
Unido, já mostrou que a rede social é a mais nociva à saúde mental dos jovens.
A deterioração da autoimagem, quando a pessoa passa a ser muito crítica com a
própria aparência ao se comparar com os outros, é uma das consequências do uso
descontrolado do aplicativo. Para especialistas, a clareza de que a alta
exposição não é saudável é o primeiro passo para amenizar ou se blindar contra
o problema.
— Você deve perceber em que medida está passando da linha
vermelha. Não há nada que ajude mais do que a consciência. Com ela, vem a
reflexão e as medidas necessárias. Eu tive uma paciente que disse que proibiu a
si mesma de usar a rede social a partir das 18h. A disciplina vem com a
percepção de que aquele prazer momentâneo nem sempre é útil ou positivo. Então,
tratando como um vício que tira a liberdade e interfere na sua vida prática,
você pode criar regras para se proteger — afirmou Eliane Cotrim Levcovitz,
membro da Sociedade de Psicanálise do Rio de Janeiro (SBPRJ).
Para a especialista, a distorção na autoestima acontece
quando a pessoa passa a depender de curtidas e seguidores para existir. Ela
destaca que nada substitui relações de carne e osso. Por isso, indica investir
mais em interações pessoais. A psicanalista sustenta que o desequilíbrio
acontece também quando o Instagram começa a representar mais do que um
instrumento de comunicação e passa a ser um padronizador de comportamento. Ela
orienta que cada um valorize mais sua singularidade.
— Você vê aquelas fotos de famílias juntas passeando e uma
felicidade generalizada, e esquece que a vida não é assim. Como a pessoa passa
a atrelar sua autoestima a esses padrões que são mostrados, suas fragilidades
ficam realçadas. Mas não devemos nos sentir na obrigação de ser como ninguém.
Não podemos perder a oportunidade de ser do nosso jeito, autêntico. Diversidade
é uma coisa terapêutica e enriquecedora — comentou Eliane Cotrim.
A desilusão com as redes sociais pode levar ao isolamento,
à solidão, à ansiedade e, em casos mais extremos, à depressão. A psicanalista
Mônica Donetto Guedes, porém, explica que, muitas vezes, o adoecimento é
anterior à tecnologia. Para ela, em algumas situações, as redes sociais passam
a ser encaradas como um recurso para apaziguar uma dor, ou um modo de não se
sentir só, o que leva a uma distração excessiva.
— Nesses casos, eu acredito no poder da comunicação. Uma
das soluções é alguém próximo chamar a atenção e orientar. Falar 'poxa, olha o
que está acontecendo, não estamos conseguindo conversar, você já parou pra
pensar o quanto isso está sendo prejudicial pra você, já olhou o tempo que
perde olhando o celular tentando entender algumas coisas sobre o outro?'. O
papel das pessoas conscientes é fazer o outro olhar para o problema também —
afirma Mônica.
A psicanalista diz que tem recebido cada vez mais pacientes
por queixa de compulsão digital, situação que tem causado desde problemas de relacionamentos
a problemas de aprendizagem em crianças que não querem desgrudar dos aparelhos.
Ela conta que as famílias não têm conseguido administrar a questão, e recomenda
que o controle comece desde cedo:
— A fase ideal pra ter telefone é quando a pessoa começa a
se locomover sozinha e vai de um lugar a outro sem a presença de um adulto.
Enquanto essa criança não fica desacompanhada, ela não precisa de telefone. A
família precisa ver o que está sendo visto pela criança, saber o que ela segue,
quais são os lugares de interesse que ela busca, pra saber onde ela anda se
construindo como pessoa.
Sobre a medida radical de excluir a conta do Instagram para
tentar se desintoxicar, Eliane Cotrim acredita que pode ser uma boa medida
temporária.
— Se há um descontrole, bloquear você mesmo pode ser uma
opção. Abrir mão por um tempo, para refletir, até se sentir mais forte para
fazer um uso diferente — orienta a psicanalista.
Para Mônica Donetto Guedes, não se pode crucificar o
Instagram, que é um recurso importante para comunicação e criação de uma rede.
Ela diz que o caminho é o autoconhecimento.
— Talvez, excluir sirva como um remédio amargo que vai
fazer bem em determinado momento. Mas, se a pessoa não for buscar entender o
que está por trás da compulsão, vai adoecer de outra forma, vai buscar outro
recurso para estancar um grande problema — esclarece a especialista.
Agência O Globo